Um ótimo artigo extraído do blog http://blogbloqueio.blogspot.com 
Preocupado com a ascensão do fascismo  na Europa, denominado de "nova    direita", o pensador e semiólogo  italiano, Umberto Eco, já em    1995, em artigo intitulado A nebulosa  fascista, (Folha de S.  Paulo-Cad.Mais!    14/05/95) propôs 14 pontos  que visam distinguir o nazismo do  "protofascismo"    na sociedade  contemporânea. (O "proto" refere-se aos sinais de um  início    ou os  sintomas de ressurgimento do fascismo em nossa época). 
 A  seguir, apresentamos 8 distinções entre ambos, baseados em    U. Eco, S.  Beauvoir, S. Sikek, entre outros da bibliografia  consultada.
1)  O nazismo tinha uma teoria das raças, do povo ariano naturalmente     escolhido para mandar nos demais, era anti-cristão e seguia a  filosofia     materialista. Para Hitler, a decadência da civilização proviria     obrigatoriamente do cruzamento de raças, portanto, sua solução    era  que a humanidade fosse dividida segundo as raças, onde haveria de     fundar o Übermenshc (super-homem). Seu regime político era   necessariamente    totalitarista. Já o fascismo mesmo não sendo  inteiramente totalitário,     era um sistema de força que deixava a  população dividida,    entre os partidários da truculência e os  pressionados a passar    para o lado dos fortes, senão seriam  perseguidos. Tanto faz se o  fascismo    for de estado, de uma  instituição, de grupos ou indivíduo,    sua atitude é fundada na  intolerância, na perseguição    aos diferentes e termina gerando efeitos  traumáticos sobretudo  naquelas    pessoas que são despossuídas de  poder. A tolerância é    uma virtude que "tem certos limites, que são os  de sua própria    salvaguarda e da preservação de suas condições de     possibilidade" (Comte-Sponville, A., 1995, p. 173-89). 
Assim  como não se pode ser tolerante com o criminoso, também    não se pode  ser tolerante com quem é intolerante. Karl Popper,    observa que há um  paradoxo da tolerância: "Se formos de uma tolerância     absoluta, mesmo  para com os intolerantes [e protofascistas]e se não  defendermos    a  sociedade tolerante contra esses assaltos [agressões, abusos de  poder,     terrorismos], os tolerantes serão aniquilados, e com eles a   tolerância".    Portanto, ser tolerante para com o protofascismo e seus  agentes - que  são    fudamentados na intolerância aos diferentes no  modo de ser, de pensar    e agir - é, pois se oferecer ao aniquilamento  enquanto virtude e  pessoa    existente.
2) Um traço  protofascista é o "culto da ação pela    ação". A ação fascista é  beligerante e carece    de reflexão prévia, logo, é uma ação de fundo     irracional ou passional e imprudente. O fascista não fala, age e faz     discursos. Quer dizer, nele some a pessoa - que fala - para dar lugar   ao discurso    político em nome de alguma causa. O discurso que a  engendra costuma  vir    em forma de razão e moral cínicas, de moralismo  e legalismo  positivista.    Segundo S. Sizek, a "razão e a moral são  cínicas" na medida    em que eles sabem que fazem um ato mau, mas mesmo  assim argumentam  sobre a "justeza"    e a "humanidade de seus atos".  Sua denúncia não é baseada    na justiça, mas no seu próprio sentido de  justiça que visa    prejudicar alguém, por vezes fazendo uso da delação,  da    palavra ferina, de insinuações e alusões e até pode    usar de  agressão física num momento de descontrole. (No caso do    terror, a  violência extrema é calculada racionalmente, portanto,    não se trata  de um ato louco, mas de um ato perverso). O  protofascista,    procura  justificar que seu ato foi "para o bem coletivo...", "para  evitar a     decadência estética das artes...", "para evitar um mal maior" ou     ainda como era freqüente nos tempos da ditadura: "para salvar a nação     dos comunistas, da corrupção, dos gays", etc.
3) Enquanto o  desacordo é sinal de diversidade, o protofascista  pretende    alcançar o  consenso explorando o medo e a angústia das pessoas.    O ambiente de  trabalho, por exemplo, é lugar escolhido para gerar  intrigas,     divisões. Há estudos que trabalham com a hipótese de que    espaços  movidos pelo espírito protofascista produz mais esquizofrenias      paranóides que os outros. Assim como existem seres humanos   "terapêuticos",    que fazem bem aos outros, também há personalidades  perversas que    tem a capacidade de causar desarmonia social,  desequilíbrio psíquico    e atravancar o andamento de projetos,  desenvolvendo: desconfiança,  ressentimento,    inimizade, sensação de  pavor, de perseguição ou    paranóia.
4) Não importa se a  ideologia "oficial" do grupo é nazi-fascista,    anarquista, ou até  mesmo socialista ou ecologista, a tática  protofascista    pode  intencionalmente ocupar todos os espaços para fazer sua política    de  "tudo vale". Os indícios vão desde slogans do tipo "Brasil:    ame-o ou  deixe-o" (lembram do período Médice?), também,    posicionamentos do  tipo "quem não está conosco, está contra    nós" (comuns em assembléias  de decisões). Por vêzes,    as atitudes moralistas ou legalistas "da  letra" podem esconder  interesses ocultos    de ânsia pessoal pelo poder  ou de gozo perverso em sustentar a atitude     de beligerância.
5)  A estrutura psíquica do protofascista tende a ser perversa e   narcisista.    "Perversa" porque são incapazes de amar outra pessoa e  respeitar a lei     que fundamenta a convivência humana e "narcisista"  porque "acha feio o     que não é espelho"; quanto patológico, o  narcisista rejeita    tudo que é diferente (idéias, opiniões, crenças,     valores, modo de agir e de ser) e somente aceita o que é seu igual. Há      patologia no seu ato de olhar que sempre acha alguém ou grupo como   "mau".    Para o nazista, o narcisismo está em atribuir a culpa de tudo  de ruim    na economia e na sociedade aos judeus. Hoje, o fascista  pensa que  aqueles que    não se enquadram exatamente nas idéias,  crenças e valores    que ele acredita, devem ser queimados, eliminados  socialmente ou  fisicamente.    A vontade de poder do nazismo e a  intolerância do fascismo tem  repugnância    pela compaixão ou empatia  que é a capacidade de se colocar no    lugar do outro, de sentir-se na  pele do outro e sofrer com ele. (O  mesmo posicionamento    do fascista  acontece com o terrorista, com um diferencial: sua causa é     o gozo  místico que está acima da vida dele e de todos, não    há compaixão, não  há empatia, só fanatismo).    É próprio da estrutura perversa e  narcisista do protofascista:    a dureza de caráter, a frieza de  espírito, a indiferença,    a secura no coração, a insensibilidade  diante de um necessitado    e sua tendência a falar mal dos que não se  adequam à sua    camisa de força moral. São os agenciadores das fofocas e  da  politicagem.    Goebbls, o ministro da comunicação de Hitler, dizia  que "uma fofoca    é uma mentira que repetida várias vezes, terminam  virando verdade".
6) O protofascista, acredita [delira] que  está em marcha uma  conspiração,    uma rede secreta de conspiração. Os  supostos inimigos podem ser    os comunistas, os negros, os gays, as  mulheres que estão subindo ao  poder,    todos aqueles que recusam a  fazer pacto cego com ele, são vistos como    os "do mau". Sua visão de  mundo maniqueísta divide-se entre os    que representam "o bem" e os que  representam "o mau". Um fascista  costumava    dizer: "Quem não está do  nosso lado é contra nós".    É notável seu desprezo pelo pluralismo de  idéias, a incapacidade    pelo diálogo e debates de idéias. Eles pensam  que estão    sempre do lado do bem e da verdade absoluta. O  protofascista vive a  fantasia    de ter sido eleito pelo divino para  fazer o bem. Seu ideal e ação    são messiânicos. (Nesse sentido, tanto  os EUA, como os terrorista    tem algo em comum: o messianismo delirante  - escrevo esse adendo após    os ataques de 11/09/01, em Nova York).  Segundo U. Eco, os fascistas  estão    condenados a perder suas guerras  porque são visceralmente incapazes de     avaliar objetivamente a força  do inimigo.
7) Para o protofascista, "não há luta pela vida mas  vida pela     luta". Acredita que o homem é o lobo do homem, a vida é  uma luta    em  que vencem os mais fortes. Vivendo em estado de guerra  permanente, ele  vê    o pacifismo como fraqueza ou simplesmente um mal  na sociedade  atual. Umberto    Eco chama de "complexo de Armagedon",  porque há nele a  crença    de que haverá uma batalha final para  derrotar de vez os  inimigos, após    o qual o movimento controlará o  mundo. Após a "solução     final", haverá uma Era de Ouro, o que  contradiz com o princípio     da guerra permanente no fascismo. Enquanto  a Era de Ouro não vem, alguns     poucos fascistas escolhem viver  perigosamente o gozo da luta  política.    Mussolini, símbolo número um  do fascismo, que se aliou a  Hitler    na 2a. guerra mundial e que  acabou pendurado de  cabeça para baixo, exposto    à execração pública  dos italianos, tinha  como lema    de vida "vivere pericolosamente".  Dizia: "Prefiro um dia de  leão a mil    de ovelha".
8) Para  além das idéias de Umberto Eco, observamos que o  protofascista    é  movido pelo esquizo-paranoidismo. Por exemplo, em casa tende a ser     uma pessoa de convivência harmônica, aparentemente equilibrada,    mas  quando está com seu grupo de iguais ideológicos, entra em    "transe  grupal", isto é, alucina um campo de batalha onde se oferece    aos  imperativos da gestalt do grupo, como um soldado, uma bestasfera   agressiva,    intriguenta, e suicida, enfim, abdica de sua identidade  pela "causa"  mítica.    Alguém disse que tais pessoas são tomadas pelo  "espírito    de Torquemada" (inquisidor espanhol que mais matou em nome  da 'santa  inquisição')    ou pelo "estilo Goering", o segundo homem  após Hitler, que na  intimidade    era bonachão, amante das artes e da  cultura, mas no trabalho colocou    sua inteligência na invenção dos  campos de concentração    e no extermínio em massa dos não arianos.  (Esse estado de "transe"    poderia ser coletivo e vingativo; uma vez  que é puramente passional  poderia    causar efeitos extremamente  imprevisíveis, tanto homicidas como  suicidas.    É só dar uma olhada na  história das guerras).
Uma vez terminada a ditadura militar, no  Brasil, de clara orientação    fascista, lamentavelmente ainda sobrou  seus efeitos camuflados entre  diversos    grupos sociais, tal como  aquele que ensaiou um movimento separatista  no sul    do Brasil. Na  convivência cotidiana, os protofascismos estão expressos     nos  assédios morais, nos discursos que desqualificam o próximo,    nos atos  de injustiça, nas bisbilhotagens dos grampos telefônicos,    nas  intrigas calculadas para prejudicar um colega de trabalho ou  estudo,  nas    falas e atos provocativos de qualquer espécie, etc.
Diante  do obscurantismo de nossa época, da esclerose de idéias    e de  valores, da mediocridade de pensamentos que não consegue dar  conta     de entender a complexidade de nossa época e, sobretudo, a ausência    de  sabedoria em todos os setores da existência humana, só nos resta     ficarmos de plantão para prevenirmos em relação ao protofascismo     individual ou institucional.
Ou seja, no cenário mundial  contemporâneo, há indícios    de aparecimento de um novo fascismo (o  protofascismo) conforme  apontamos no    início desse artigo, projetando  uma nova Auchwitz, ou outros novos  movimentos    movidos pelo ódio,  que obrigam os diferentes a pregar no peito ou na    alma suas  ideologias tresloucadas, símbolos e atitudes de intolerância     e de  opressão do mais forte sobre os fracos.
Infelizmente, o  fascismo, nazismo e o racismo estão entre nós    sob inocentes  disfarces. (Já o terrorismo, pela sua própria natureza    e modo cruel  de expressão é de origem perversa e narcisista, gostando    de se expor  os seus efeitos e fetiches visando obter gozos "loucos"  com o  sofrimento    dos outros).
Contra o protofascismo, o nazismo, o  racismo e o terrorismo resta-nos  mais    que nos defendermos, rápida e  eficazmente, desmascará-los, desmantelar     sua armação homicida e  suicida, que pode aparecer em qualquer    momento e em qualquer parte do  mundo. Nossa senha deve ser: "não  esquecer,    resistir, denunciar e  sobretudo apostar na VIDA, sempre!!!".
Sugestões    de bibliografia sobre o fascismo:
    BEAUVOIR, S. O pensamento de direita, hoje. Rio de Janeiro:   Paz e Terra, 1972.
BECKER, S. A fantasia da eleição divina:  Deus e o homem. Rio  de Janeiro: Cia. de Freud,1999.
COMTE-SPONVILLE,  A. Pequeno tratado das grandes virtudes. São  Paulo: M. Fontes,  1995.
DOMENACH. J.M. Propaganda política. DEL, s. d.
ECO,  U. A nebulosa fascista. Folha de S. Paulo - Cad.  Mais!,  14/05/95.
FREIRE COSTA, J. Narcisismo em tempos sombrios. In: Percursos  na  História da Psicanálise. Rio: Taurus-Timbre, 1988.  
REICH,  W. Psicologia de massa do fascismo. Porto: Publicações   Escorpião, 1974
SIKEK, S. Eles não sabem o que fazem: o  sublime objeto da  ideologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990.
______. O superego pós-moderno. In: Folha de S. Paulo-  Cad.  Mais!, (...)  1999.
Filmes:
- O OVO DA SERPENTE de Ingmar Bergman.
- FASCISMO SEM MÁSCARA:  Um antigo filme  soviético que revela os  instrumentos de propaganda do fascismo.
Raymundo de Lima
Psicanalista, mestre em Psicologia Escolar (UGF) e Doutor em   Educação pela Universidade de São Paulo (USP).  professor do Depto.   Fundamentos da Educação (DFE) da Universidade Estadual de Maringá (Pr), e   voluntário do CVV-Samaritanos de Maringá (PR).